sexta-feira, 21 de agosto de 2009

20 anos sem Raul Seixas


Eu sei que determinada rua que eu já passei
Não tornará a ouvir o som dos meus passos
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos
E que nunca mais eu vou abrir
Cada vez que eu me despeço de uma pessoa
Pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez
A morte, surda, caminha ao meu lado
E eu não sei em que esquina ela vai me beijar
Com que rosto ela virá?
Será que ela vai deixar eu acabar o que eu tenho que fazer?
Ou será que ela vai me pegar no meio do copo de uísque,
Na música que eu deixei para compor amanhã?
Será que ela vai esperar eu apagar o cigarro no cinzeiro?
Virá antes de eu encontrar a mulher,
A mulher que me foi destinada,
E que está em algum lugar me esperando
Embora eu ainda não a conheça?


Vou te encontrar
Vestida de cetim
Pois em qualquer lugar
Esperas só por mim
E no teu beijo
Provar o gosto estranho
Que eu quero e não desejo
Mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar
Eu te detesto e amo Morte,
Morte, morte que talvez
Seja o segredo desta vida



Qual será a forma da minha morte
Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida
Existem tantas... um acidente de carro
O coração que se recusa a bater no próximo minuto
A anestesia mal-aplicada
A vida mal-vivida
A ferida mal curada
A dor já envelhecida
O câncer já espalhado e ainda escondido
Ou até, quem sabe,
Um escorregão idiota num dia de sol
A cabeça no meio-fio
Oh morte, tu que és tão forte
Que matas o gato, o rato e o homem
Vista-se com a tua mais bela roupa
Quando vieres me buscar
Que meu corpo seja cremado
E que minhas cinzas alimentem a erva
E que a erva alimente outro homem como eu
Porque eu continuarei neste homem
E nos meus filhos
Na palavra rude que eu disse para alguém
Que não gostava
E até no uísque que eu não terminei de beber
Aquela noite...



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